quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A FÉ ABRANGE TODAS AS REALIDADES - Só que a excluímos de nosso trabalho cotidiano...




A pior coisa, ou o pior desserviço, que prestamos à vida de fé e do Reino de Deus é entender a nossa fé como algo privado, que tem a ver com crenças pouco sustentáveis pela razão e pelo conhecimento, e que serve apenas para fins pessoais, do íntimo de cada um, mas que por fim deve ser vivida sem ser misturada com a política, a sexualidade, a vida acadêmica, sociológica e, sobretudo, profissional.

O mundo profissional tem a tendência de respeitar a fé individual como uma questão de ordem privada. A idéia por trás disso é que a minha fé de ser deixada do lado de fora de meu escritório ou da fábrica onde trabalho.

Também na vida acadêmica, de modo geral, acha-se que cada um deve possuir a sua fé, mas os estudos e as pesquisas têm a ver com a ciência — essa, sim, é real e deve ser recomendada a todos.

Não percebemos que, no fundo, o problema com essa visão é que ela reduz a fé a algo inútil. Se tiver alguma utilidade ela é intima e, sobretudo, pouco confiável e profundamente questionável.

Além disso, esse posicionamento consegue encaminhar a fé para um tipo de irrelevância social, ou um tipo de narcótico que embriaga algumas mentes fracas, sem conteúdo, sem reflexão e sem muita importância.

Não nos damos conta que ao adotarmos esse princípio de que a fé é algo desprovido de conteúdo que pode e deve ser refletido, passamos a deixar de ter uma base para o agir transformador, pois a vontade não é movida para aquilo que não tem sentido.

Isso explica um número cada vez maior de indiferença de alguns cristãos quanto ao que acreditam. Essa indiferença, com certeza, é fruto de uma ausência dos conteúdos da fé e de suas implicações no mundo, e em especial no mundo dos negócios de nossas empresas, de nossa vocação seja lá no campo profissional que for.

Os cristãos nem sempre foram assim, e temos hoje que recuperar os insights que a Reforma Protestante nos legou nesse sentido. É preciso que avancemos para certos conceitos que, por questão de tempo e de espaço, foram intuídos, elaborados, mas não plenamente explorados.

Os protestantes sempre tiveram a tendência a avançar nessa ligação com fé e o restante da vida em plenitude, juntando vocação e fé para reformar, não simplesmente a religião, mas sim toda a história para a glória de Deus.

Nesse sentido, Claudio Antônio e Fernando Antônio Cardoso Leite argumentam que:

"A arte e a ciência eram vistas pelos protestantes como vocações divinas: Assim emergiu, entre eles, um sistema de interpretação da realidade que não apenas desconhecia a dicotomia entre racionalidade e fé, mas que também propunha uma compreensão renovada da razão e da natureza. A valorização do trabalho manual conduziu os estudiosos protestantes das bibliotecas às oficinas mecânicas, às tinturarias e às lavouras e aos jardins, integrando mente e mãos".(1)

Não podemos concordar que nossas melhores mentes pensantes fiquem fora do mercado de trabalho. Isso seria deixar intacto um imenso campo missionário, onde os cristãos poderiam servir para uma transformação social mais ampla.

Para ser mais específico, tenho que entender que minha crença em Deus é um sistema que forma o sentido de tudo o que existe. Se não existe algo maior por trás de tudo, minhas ações são ações desconexas.

Se isso é verdade, eu mesmo me reduzo e me banalizo. É assim porque sou projetado para ações inteligentes e com sentido. Se minhas ações são imprecisas, não refletidas e sem conteúdo, tenho no mínimo ações e projetos com total ausência de valor, o que os inviabiliza como projeto de vida.

Por outro lado, minha crença num Deus que existe é uma crença que entende que a existência de um Deus supremo é uma existência com propósitos. Esses propósitos são na verdade o exercício de quem Ele é.

Dessa forma, as ações de Deus são ações com profundidade no mundo. Isso me leva a acreditar que meu trabalho é muito mais do que um “ganha pão”, é muito mais do que uma busca por ganhos financeiros.

É, antes de tudo, para ser coerente com nossas crenças, uma busca por vida. Nosso trabalho tem que ser movido pela consciência de que Deus tem propósitos. Seus propósitos são abençoar a vida humana, salvar, libertar pessoas de todo tipo de escravidão, de libertar os seres humanos das coisas que lhes fazem mal, que os adoecem e os desumanizam.

Cristo, que era Deus, tinha uma missão:

"O Espírito do Soberano, o Senhor, está sobre mim, porque o Senhor ungiu-me para levar boas notícias aos pobres. Enviou-me para cuidar dos que estão com o coração quebrantado, anunciar liberdade aos cativos e libertação das trevas aos prisioneiros" (isaías 61.1)

A crença de Cristo estava fundamentada no conhecimento que Ele possuía de Deus Pai e na sua relação na Santíssima Trindade. Sua missão é uma missão que envolve boas notícias acerca de uma outra vida possível aos que sofrem, aos que se sentem aprisionados, aos que estão tristes.

Esse tipo de conhecimento é o conhecimento que precisamos ampliar em nossas vocações. Ser cristão em nosso ambiente de trabalho é muito mais do que evangelizar da maneira tradicional como temos entendido “evangelismo”.

Viver nossa fé na integridade de nossas vidas, adentrando o mercado de trabalho, é algo que precisa ser bem entendido por nós. Muitos cristãos acham que vivenciar a fé na ambiência profissional significa incorporar um discurso religioso, falar salmos, recitar versículos bíblicos, orar o Pai Nosso antes das reuniões e assim por diante. Tudo isso é plenamente recomendável para a vida de modo geral, mas não é nisso que devemos pensar quando desejamos integrar nossa fé ao nosso campo profissional.

Antes, devemos entender que agimos no mundo a partir de convicções arraigadas em nosso entendimento. Se nosso entendimento é formado pelas Escrituras, seus valores devem permear tudo.

Isso faz toda diferença, por exemplo, na maneira como trato pessoas. Segundo minha fé, posso entender pessoas como objetos a serem usados para eu ganhar dinheiro, ou como seres humanos criados à imagem de Deus, dignos de viver e ser reconhecidos em suas potencialidades dadas por Deus.

Essas potencialidades devem ser remuneradas, estimuladas, reconhecidas e plenificadas mais e mais. É nesse sentido que posso e devo integrar minha fé e meu conteúdo na ambiência profissional.

Na verdade integrar a fé é agir baseado numa experiência. Ao relacionar essa experiência ao meu espaço profissional, passo a adquirir conhecimento. Dessa forma relaciono esse conhecimento a tudo o que me rodeia, faço experimentos e colho resultados e transformações.

Sobre isso Dallas Willard afirma:

"Conhecimento, e não a simples crença ou o simples compromisso, confere a quem possui uma autoridade ou um direito – e até mesmo uma responsabilidade – de agir, dirigir ação, estabelecer e supervisionar política e ensinar".(2)

Em nossa profissão, temos que nos vincular aos projetos de Deus de mudar a vida de pessoas através de melhorias sanitárias, medicamentosas, terapêuticas, políticas, empresariais, gerando renda, aprimorando seres humanos em suas potencialidades dadas por Deus e assim por diante.

Quando eu trago esse tipo de conhecimento que pode ser observável em minha prática, apresento um nível de autoridade sobre o que acredito. Minha crença se torna algo que opera na vida e traz resultados. Os resultados podem e devem ser averiguados e discutidos.

É nesse sentido que meus conteúdos de fé têm de adentrar o mercado de trabalho, não somente para “falar de Jesus” às pessoas. Sem dúvida isso faz parte, mas devemos ir além e trabalhar com mais sentido e profundidade, pois nossos valores podem e devem ser valores que enobrecem empresas, trabalhos, trazendo qualidade de vida e inteligência de mercado, a fim de administramos tudo como Deus sempre sonhou, fazendo de nossa profissão um caminhar pelo jardim de Deus.

Por fim, uma fé que não está focada a inserir-se em todas as áreas da vida com propostas e retidão é uma fé descaracterizada, sem sentido, anti-bíblica e insensível.

Devemos, pois, resistir aos recantos a que fomos jogados, e sair com competência e inteligência transformadora, a fim de gerarmos vida a partir de uma fé que faz sentido e dá sabor ao nosso dia a dia.

Isso poderá inundar nossos dias de beleza e luz. Deverá nos alimentar em nossa jornada profissional, muitas vezes rotineira e sem sentido, cheia de lutas e conflitos. Somente uma visão mais ampla de nosso trabalho, uma verdadeira teologia do trabalho, poderá nos ajudar a viver uma experiência de Deus na prática, mudando o sentido das coisas, adquirindo sabedoria e satisfação, experimentando uma vida mais saudável e cheia de alegria, sendo abençoados e abençoando quem está ao nosso redor.

MARCO ANTONIO FERNANDES

1-Leite, Cardoso Cláudio, Cosmovisão Cristã e Transformação, Viçosa-MG, Ed. Ultimato, p. 33
2-Willard Dallas, Conhecendo A Cristo Hoje, Rio de Janeiro, 2011, Ed Ichtus, p. 28

sexta-feira, 29 de julho de 2011

DEUS NO MEU TRABALHO - A ALEGRIA DE ENTRAR NA ALEGRIA DELE



Há anos venho trabalhando numa corrente de pensamento dentro do cristianismo, que se recusa a ver que a única maneira de servir a Cristo é tornando-se pastor, missionário, músico cristão, diácono ou presbítero.

Eu mesmo, apesar de ser ordenado ao pastorado e tendo formação em teologia, desenvolvo meu ministério de tempo integral de duas maneiras. A primeira na Indústria Farmacêutica, na área comercial que é uma de minhas paixões. A segunda; escrevendo, aconselhando, pregando e lecionando espiritualidade cristã em igrejas, retiros, grupos pequenos, etc.

Pesquisando a bíblia não consegui ver que exista em minha vida um trabalho secular (Indústria Farmacêutica) e um trabalho sagrado (Igreja, estudos, pregação). Entendo que tanto a área comercial como o ministério da Palavra são ações de transformações históricas onde Deus está inserido.

Vejo Deus nas Escrituras empenhado em curar e levar condições de tratamentos médicos a pessoas ao redor do mundo. Minha missão na Indústria Farmacêutica significa entrar em contado com a missão de Deus de trazer vida e saúde a um mundo adoecido. Remédios a preços acessíveis a mais pessoas para alívio de sua dor é o sonho de Deus e eu me empenho em trabalhar com sentido para que esse sonho se realize mais e mais.

O mesmo posso dizer do cristão que é engenheiro, médico, advogado, lixeiro, cabeleireira (o), estilista ou enólogo. Todos sem exceção estão servindo a Deus e trabalhando em sua missão de sustentar o mundo e aperfeiçoá-lo, quer saibam disso ou não.

Em Gênesis capítulo 1 Deus é o Deus Criador. Ele Cria e sustenta. Ele nos ensina a vivermos para cuidarmos do que Ele criou (1.26). Administrar recursos, cuidar da agricultura, multiplicar bens e produtos para o bem estar dos seres humanos é um chamado de Deus e Ele nos convida a adorá-lo em todas essas vocações (I Co 10.31).

É uma pena que muitos cristãos não acreditam que podem e devem experimentar a Deus em seus escritórios, cozinha, reuniões, bancos e projetos os mais diversos.

Toda criação de Deus é envolvida na morte e ressurreição de Cristo. Somos todos sem exceção chamados a embelezar o mundo, transformá-lo no poder do Espírito Santo que nos vocacionou em nossos empregos. Não somente falando de Jesus ao próximo, mas também cuidando, amando, criando, servindo, amadurecendo e trazendo para a Terra a Nova Jerusalém com toda sua qualidade e beleza em termos de vida e sociedade.

Deus te abençoe no lugar de seu trabalho. Exerça aí mesmo seu sacerdócio real. Deus está com você nas batalhas por um outro mundo possível.

Marco Antonio Fernandes.

A UNIÃO COM DEUS NO MERCADO DE TRABALHO




“A alma vê e goza, nesta divina união, uma grande fartura de riquezas inestimáveis, achando aí todo descanso e suavidade que deseja. Sente-se cheia de bens e alheia de males” ( João da Cruz)

A experiência de união em amor com Deus deve ser o alvo mais profundo e maior de nossa existência. Nessa experiência encontramos autoconhecimento e conhecimento da Pessoa de Deus e assim desenvolvemos familiaridade com suas qualidades.

Um dos maiores desafios de nossa época é influenciarmos os ambientes de trabalho onde passamos a maior parte de nosso tempo. É nessa ambiência que devemos ampliar nossas consciências para um experimento mais intenso de Deus.

Tenho uma grande amiga de vários anos. A Jeunesse é uma decoradora que trabalha com texturas e desenhos de interiores, harmonização de ambientes e refinamento em termos de combinações. Ela tem ampliada percepção sobre os efeitos de determinadas texturas que quando aplicadas e combinadas com cores alegres e vivas trazem um agradável efeito e belas sensações ao coração de quem chega nesses ambientes que ela transforma.

Quando ela acaba um trabalho em uma parede, ela contempla aquilo e costuma dizer o seguinte: “Olha aí que linda parede que O Senhor fez”. Isso para ela é uma experiência de união e contemplação de Deus. Jeunesse não separa seu maravilhoso trabalho de seu ministério. Muito menos entende que seu trabalho é um exercício solitário, mas sim de intimidade onde dois praticamente experimentam uma unidade. Ela e Deus.
Também vi uma frase de uma arquiteta esses dias que ao meditar em seu trabalho escreveu o seguinte: “A arquitetura é a arte de abrigar a vida”. Isso é maravilhoso, pois ela deixa de ver seu trabalho somente da perspectiva técnica e o amplia para ele atingir seu sentido pleno, fazer a vida melhor.

Deus está trabalhando todos os dias a fim de trazer vida e plenitude ao seu mundo. Somos chamados a experimentar a Deus ande quer que ele esteja nos usando para trazer vida aos seres humanos através de nosso trabalho.

Nesse ambiente somos chamados a uma experiência plena. (I Co 10.31) Ouvindo Deus, amando-o e exalando em todos os espaços e em todo o tempo a alegria de sermos seus cooperadores. É isso que nos define como gente, somos homo adorans, ou seja, essencialmente sacerdotes.

Deus sabe os sofrimentos que temos enfrentado em nosso trabalho, mas de alguma maneira que desconhecemos, Ele poderá tomar essa dor e transformar isso em adubo em nossa maturidade e usar isso para germinar um novo tempo.

A Excelência em nosso trabalho não deve ser outra coisa, senão os efeitos de uma experiência. Nesse caso uma experiência de profunda união com Deus em nossas atividades diárias.

Marco Antonio Fernandes.